sábado, 28 de março de 2009

Situação

Cansei de me desamar.
Rio primeiro
para depois ficar alegre.
Esqueci que estou triste.


Lembro que ainda te amo.
Sei que te odeio.
Cuidado.
Cansei de me desarmar.

Fase II - Paixão

Eu já contei estrelas,
ovelhas,
grãos de areia
na ampulheta.
Já deitei na grama
só pra namorar a lua
e esperar a noite da tua vinda.
Dormi na rede
pra me embalar com tua ausência
sempre tão presente.
Procurei palavras
no quebra-cabeças do silêncio
e vasculhei palheiros
em busca de agulhas
precisas pra te tocar.
O que eu preciso
é da exata imprecisão
do teu sorriso,
do teu olhar cheio d'água
me dizendo do teu amor maior
que ocultas e do gozo que ostentas
acintoso
em minhas mãos.
E deste torpor
de vulcão adormecido
querendo varrer pompéias
de solidão.

Fase I - Atração

Taquicardia.
Um olhar derrota
a apatia,
uma palavra fugidia
- vem -
vence o que eu não diria,
escreve com tua letra
a minha poesia.
Um toque colore
a face do dia
vermelho,
e eu me faço
tapete do seu passo,
espelho
desta fantasia.
O que eu seria
se você quiser que eu seja
um dia.
Me beija
como quem tem certeza
do que faria,
como a luz que irradia
de quem caminha.
Prova a teoria:
vida é frio na espinha.

terça-feira, 24 de março de 2009

Poema pra minha puta

Eu quero o pacote completo,
o programa inteiro,
beijo, boquete, boceta e cu.
Meu pau ereto
vai se locupletar louco
no play do corpo.
Não tem outro jeito,
não há dia perfeito
que não seja em nudez:
hoje, sempre e outra vez.

A vez

Era pra ontem
Ficou pra hoje
Deixa pra amanhã
Nunca será.

O pior já passou

Acordei hoje com um gosto
de fim de mundo.
Na verdade, já perdi o juízo final.
O horóscopo no jornal diz
que o dia é bom para relações afetivas,
mas meu coração está aflito,
premonição de algo ruim.
Pior não pode ser:
você partiu em silêncio,
sem ter a coragem e a decência
de dizer que o amor chegou ao fim.

Eu sou nada

O frio me corta
no sentido sul.
Produzo fogo
em um ponto remoto.
Apenas o suficiente.
Nada sob a pele
que atinja o coração.
Nas veias corre lava,
mas quem encara meus olhos
não vê sinal de alma.
Desapareço dos espelhos,
não sou visto em retratos
nem no véu da noite.
O sol retalha a manhã.
Nada de sombras,
parto sem deixar pistas
e não pretendo voltar.
Você já terá me esquecido
após o café.

sábado, 21 de março de 2009

Para as noites de chuva

Procurei de madrugada na livraria
companhia para a chuva
que do lado de fora parecia
chiado de agulha sobre álbum de vinil.
Comprei muitos livros pelas orelhas persuasivas
e jamais li os volumes.
Sou fácil de ser seduzido,
basta um sorriso, promessa de felicidade
efêmera que minha imaginação fértil
delira ser eterna.
Com ouvidos e olhos sobre os discos,
exausto e confuso, desisti de acompanhar
tantos lançamentos.
Restam o café e o cigarro
preenchendo as horas:
coisas simples.
Gente eu não agüento mais.

O velho da Ilha de Faaroe

Caminho e não falo com ninguém o dia todo,
enormemente fascinado pelo silêncio e pela solidão,
longe da ruidosa prostituição e da carnificina
do cinema.
Defino-me como um espectro quase lendário vagando pela costa leste.
Esta ilha é o começo e o fim e, de fato, o tudo.
Nunca exílio, mas fonte de inspiração vital.
Sinto falta da última mulher que amei
e estou muito próximo dela.
Nossa história foi infinitamente estimulante
mesmo depois da sua partida.
Não acredito em reencontros noutra vida.
Ela foi minha verdadeira coluna vertebral.
Mais que as torturas do desejo
esta solitude encerra
os sorrisos de uma noite de amor.

para Ingmar Bergman, 86 anos em 15.07.2004

Deve haver algum sentido em mim que basta

Estar no canto oposto diante de você
reforçou a certeza de que é a mulher mais linda do mundo.
E então serviu-se uma bebida,
talvez para tornar mais leve
a busca vã de sentidos.
Eu encontrei o meu
quando nosso olhar se cruzou,
atravessando a cena como ponte invisível.
Ali, senti que estamos ligados.
Suas palavras me chegam como dedos
na tomada.
Eu fui outra pessoa antes de te conhecer,
antes do amor me fazer nascer de novo.
Eu te amo.
Este é o meu sentido. O único.
Está em mim. Me basta.

quinta-feira, 12 de março de 2009

Ventura

Se por ventura, tivermos tempo, será na sexta.
Se por vontade, tivermos hora, será melhor.
Se por verdade, sentirmos desejo, nos tocaremos.
Se por virtude, formos justos, ficaremos juntos.
Se por vaidade, nos evitarmos, perderemos.
Se por vício, mentirmos, repetiremos o erro.
Se por veleidade, nos beijarmos, nos encontraremos.
Se por sorte nos acharmos, permaneceremos.
Se por acaso, tivermos chance, aproveitaremos.

Meus guardados

Há muita coisa em meus guardados
que, confesso, não consegui achar.
Alhos e bugalhos.
Sem a presunção elitista
do trigo sobre o joio.
À luz do olho
é tudo parte
do que não consegui viver
e tentei aprisionar.
Lembranças a espetar
cruel e repetidamente
a memória do possível
que jamais ocorreu.

O disco

Arraial do Cabo (RJ). Foto: Leandro Wirz
Apenas ponha o disco para tocar
novamente e
me deixe só.
Minha velha poltrona vermelha
guarda meu corpo
como ninguém,
mas não evita
que os pensamentos em você
formem uma coroa de espinhos.

Nem tudo que dói sangra
mas toda dor vira costume,
não notícia.
È morno calor
(que envolve)
quando não há mais nada.
Feche a porta sem barulho
permita ao sol se pôr
em meus horizontes.

Leituras

eu leio os seus lábios.
eu leio os seus olhos.
leio seus gestos.
leio mãos, estrelas,
as cartas, os diários,
os bilhetes rápidos.

me debruço sobre cada palavra
em busca de sentidos porque
a dor me alfabetizou.
deus está nos detalhes.
e o diabo também.


é desespero vão.
seu discurso é leve,
displicente, agradável.
não há camadas de intenções.

fiquemos no raso.
o claro em excesso
é como pedra.

sábado, 7 de março de 2009

O pedido

Acaso ou destino, eu voto consciente
pelo desatino!
Todos os beijos e os quereres
fazem sentido
quando me vejo frente a você.
Renunciar aos prazeres
é a mais assustadora das escolhas.
E também a mais covarde.
O amanhã é só um caderno
de possibilidades
onde se escreve céu ou inferno.
Eu quero ser o que arde!
Só este tem asas.
O que sinto, guardo em casas
de portas abertas
onde o amor é raridade e oferta.
O único tempo é o agora,
repito o meu presente
e te peço: não vá embora.
Não hoje, não no agora de amanhã,
não na manhã deste agora.

domingo, 1 de março de 2009

Uma noite só

Todo mundo tem um coração faminto
todo mundo precisa de um pouso
todo mundo precisa de um corpo
como o seu.

Todo mundo precisa de café, cigarros,
uns trocados e amor
Todo mundo precisa de uma taxa de risco,
um teor alcóolico,
um pouco de poeta e louco.


Todo mundo quer a nudez,
todo mundo quer a sua vez,
eu quero fumo, beijos e talvez
nunca mais te ver.


A vida é isso: perder.

Maçãs

Venho tomando três
banhos gelados por noite,
tenho rezado terços,
padres-nossos, minhas nossas!
Minhas costas se contraem
ao açoite.
Eu pago os preços,
eu creio que ser feliz
é provar
maçãs.
Minha consciência me contradiz.
Eu me afogo em duplos cowboys,
você não sabe o quanto me dói
desejar sem querer
quando querer é poder.

Marrento

Eu tomo soro
depois de muita cachaça
eu fumo Marlboro
pra respirar fumaça
eu provoco o touro
só de pirraça
eu quebro o decoro
de noite na praça
eu desço o couro
no meio da massa
eu taco côco
em plena vidraça
eu crio rolo
pra ver a arruaça
eu faço o bolo
e como de graça
eu passo o rodo
porque tudo passa.

(Des)Perfeição

O sangue pinga
sobre o vidro
e escorre lento
como me sento
recostado à parede.
Como eu me sinto,
quem sabe?
Quem liga
o alarme,
o telefone?
Nem sequer uma carta
sob a porta.
Apenas letras mortas
as leis, as juras que fizemos,
as sepulturas que se visitam
uma vez por ano.
Passei tantos anos
tentando destruir a perfeição
que, enfim, consegui.
Entre flores e crânios cor de rosa
eu sou tão pálido,
envelhecido, amarelado,
páginas de livro
que escrevi sem consciência.