domingo, 25 de dezembro de 2011

Companhias



Domingo de manhã no calçadão,
os homens com seus cachorros,
as mulheres com seus filhos,
as crianças com seus brinquedos,
as enfermeiras com seus idosos,
e eu
nem comigo.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Se esta noite



Se esta noite me roubar
saiba que poucas coisas deixaram de ser ditas,
mas seriam repetidas muitas vezes
e tantas ainda seriam insuficientes.
Se esta noite me roubar
eu não voltarei
nem irei te reencontrar,
eu terei ido, simples assim.



Mas eu terei sido, simples assim,
o homem mais feliz
enquanto estive ao seu lado
pelo tempo que foi.
Se esta noite me roubar
saiba que fiz o que pude
e porque era tudo que eu sempre quis
eu te dei o melhor amor que havia em mim.


quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Dois




Saudade dos olhos que me comem.
E das suas mãos firmes, ousadas,
que ignoram negativas.


Eu jamais seria sua,
você é incapaz de ser de alguém.
Eu não te quero mesmo.


Mas hoje, aqui sozinha,
duas taças de vinho,
ao menos seus dedos em mim.     

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Fraturas


Meu corpo chegou na frente.
Fraturada entre supostos amores
que nunca existiram ou sempre serão,
a alma vem andando com toda calma
olhando cada reflexo seu
no espelho partido
analisando cada incoerência,
cada imprudência,
todas as filigranas dos erros.
E meu corpo aqui esperando
querendo tão somente beijos,
adorações incondicionais
como amores maternos.
A puta é a mãe com quem a gente pode.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Happy End

Nosso amor acabou
e nunca mais
haverá outro igual,
não somos os mesmos
e não cabe mais
em nossas vidas
amar assim.

Não o quero de volta,
como as flores e as frutas da estação,
seu tempo passou.
Foi o melhor que já tive,
mas o rio só corre na direção
do mar.
O que eu tinha pra chorar
eu já chorei.
Nosso amor acabou
e nunca mais
haverá outro igual.

Vou amar de novo.

domingo, 2 de outubro de 2011

Jogo de poder

Querer é poder
é um papo meio poliana,
conversa pra boi dormir.
Poder mesmo é fazer
o que se quer
e, sejamos, francos, nem sempre dá.
Se desse, eu seria um deus.
Mas sou só
esse monte de eus
que querem incompatibilidades,
diferenças irreconciliáveis
como alegam nos divórcios
as celebridades dos tablóides.
Poder mesmo é escrever
poesia
e é isso que quero e faço
só pra esfregar na cara do tempo
que eu sou o seu senhor
e posso até mesmo desperdiçá-lo
fazendo coisa tão inútil.
Poder mesmo é prazer.

Bastardos

Todos os meus livros
anteriores
são renegados,
filhos bastardos
da rainha de cópulas
com o cavaleio ás de espadas
ou com o irônico bobo
da corte do rei corno
manso que trepa com a mucama
como se vinte anos
ainda tivesse.

De Coração

Meu coração já teria decidido
se ele decidisse.
O que ele me disse
com toda sinceridade
foi que coração não pensa,
coração age.
Coração exige
e isso não muda com a idade.
Coração faz o que quer,
é ele, só ele, quem escolhe
e a revelia de todos os sensos,
razões e previsões,
me disse que é você, só você.



sábado, 24 de setembro de 2011

Partido

Um globo espelhado lança
fracos raios de luz no salão
a puta entediada dança
e a cabeça do bêbado cai
sobre seus ombros.
Aqui somos todos escombros.


Exibo meus truques,
mal disfarçadas intenções de cópulas
você ora ri, ora boceja
e nunca me beija.
Mexo o gelo no copo cheio,
estico os olhos nos teus seios
e você me diz não, talvez, quem sabe...


Quem sabe como consertar um coração?

domingo, 4 de setembro de 2011

Homem de muitas linhas

Você é um homem de muitas linhas,
ela disse e
cometeu a delicadeza de não dizer
tortas, talvez.
São linhas retas e não curvas
sem direção.


Você é um homem de muitas linhas,
um homem de trilhas, facetas, estilos.
Intensidade é o traço mais forte
na sua linha da vida.
Elas, todas elas, vem ao meu encontro
como caminhos à Roma.


Você é um homem de muitas linhas.
Elas, todas elas, são pauta pra sua letra,
capriche na caligrafia
ao se deitar sobre mim.
Você é um homem de muitas histórias
vividas, sentidas e escritas.


Você é um homem de muitas linhas,
transparente, fascinante e perigoso.
Vai me fazer a mulher mais feliz do mundo
e pode ser que depois vá embora
como um gato deixa a casa
pra ganhar a rua.


Talvez o amor seja o fim da linha.



sábado, 30 de julho de 2011

O vento da madrugada

O assovio me convidava a não dormir
às cinco horas da manhã, o vento varria o céu
e punha as árvores para dançar.
Fiquei na varanda na esperança
que ele me arrancasse a pele
e fizesse de mim lençol branco
pra encontrar teu corpo.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Tchau

Pairar sobre céus arranhados
deliciosamente
sem pertencer a nada,
nem nuvem

Quero essa sensação de não-vida
café frio
sorvete derretido
e ninguém por perto.

Eu gosto de você
quase sempre
mas não preciso
e não insisto

em existir.
Existo, acaso,
vou livre
e não vôo raso.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Perguntas

tudo bem
tudo bom
tudo beleza
jóia, bacana,
legal.

nada de novo
sem novidades
na mesma.

eu vou indo.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

O melhor silêncio

As melhores palavras
não nos tornam certos.
Devemos procurar o melhor silêncio.
Que não silencia. Mas cala.
Sou todo ouvidos.
E porque meus olhos estiveram
mergulhados em tuas cores,
agora os fecho.
Seguro entre a língua e os dentes
o verbo que não precisa de som
e prendo as mãos que antes
falavam aflitas pelos cotovelos.
Agora sou apenas noite agradável
convidando você para sair
de onde está e vir morar comigo.

domingo, 3 de julho de 2011

De você

Poética, eu diria.
Para ficar no enigma e no mínimo.
Porque menos é mais
E porque o mistério está para as mulheres
Como a imprevisibilidade para os homens.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Nada

Poesia não é andar de bicicleta.
Desaprendi,
se soube um dia.
Talvez seja porque passei dos quarenta
ou esteja feliz.
Talvez seja porque tenha desaprendido a viver
e não morra mais de amores.
Por nada, talvez.
A poesia se foi.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Matutino

Um gole e quero ficar
assistindo aos absurdos
que a fumaça do cigarro faz
livre, livre, solta no ar.
Sinto que agora tenho mais calma,
experimento a paz pela primeira vez.
Tenho a sensação de que acabei de sair do banho,
tenho os cabelos mais curtos,
visto uma larga camisa branca
e minha voz soa clara
sem tantos nós.
Vejo a vida com olhos de manhã.
Estou livre, livre, solto no ar
para ser belo,
ser o que quero
e desenhar absurdos que me façam feliz.
Tenho a mim mesmo,
não estou só.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Demônios lúdicos

Foto: Leandro Wirz



Disputam assento sobre meus ombros
e já perdi a conta de quantos são.
Brinco com eles – ou talvez o inverso –
como se fossem meus soldados de chumbo
da infância feliz.
Meus demônios lúdicos
adoram se apaixonar e atirar-se em precipícios,
gostam de farras, de prazeres à meia-luz,
e de meias-verdades.
Gostam de velocidade, de jogos de sedução,
de usar as palavras afiadas como lâminas
e de cuspir nos outros sua arrogância.
São todos muito vaidosos e se mantém vermelhos
sob o sol, com tridentes a postos
para espetar, furar e esgarçar
sentimentos.
E inventam de escrever poemas
e evitar a poesia da vida.

domingo, 29 de maio de 2011

Devidos lugares

Suítes, quartos, camas
redondas, King and Queen,
lençóis de algodão, seda, cetim
tapetes, chão, grama,
areia da praia, mar, piscina
banheira, garagem,
banco do carro para orais
e outros sarros,
corredor, em pé contra a parede.
Muros, mesas violentamente
desarrumadas,
escadas
de incêndio
para o nosso fogo.


Mas não teremos teto.
Não sou o tipo de cara
pra você levar pra casa.
Não cabemos na sala de estar.
Nem na cozinha, nem na despensa.
Nem em família
aos domingos.

domingo, 22 de maio de 2011

Felina

Nenhum registro capaz
de revelar a intensidade
do teu calor escorrendo sobre mim.
A combinação das nossas cores, texturas, peles e cheiros
é de fazer inveja aos deuses.
O riso como rio inteiro
deságua no mar, no ar do quarto.
O teu olhar faz meu parto
indolor.
Pérola negra me fita,
me extrai.
Me leva aonde vai.

sábado, 30 de abril de 2011

Podologia

Todos os dias ao chegar em casa,
tirava os sapatos velhos
bem acomodados à forma
e fazia um escalda pés.



Do morno conforto d’água,
seus pés ansiavam por terra,
estradas
e tapetes em brasa,
por que não?

sábado, 23 de abril de 2011

Plural

O gato tem sete.
Humildemente,
eu queria só duas.

sábado, 9 de abril de 2011

Amor entre parênteses

O amor entre parênteses
é uma janela,
um intervalo,
universo paralelo.
Não é amor entre aspas.
Entre paredes vale
tudo que for consentido.
Quantos quartos tem
um coração?

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Contradição

Quando a gente se apaixona quer
convivência.
Toda paixão é suicida.

domingo, 3 de abril de 2011

Morcego

As mães são felizes.
Os medíocres também.
Com certeza, são felizes os ignorantes
que não enxergam outra opção.
Eu quero ao menos uma vez
provar o sabor da paz
ao invés da luz da razão.
Sou a imagem do fracasso
nesta sala quase sem móveis
onde me acompanha a solidão.
Sou (im)puro cansaço
intoxicado por tragos, goles
e amores da minha coleção.
Quase me rendo, me vendo barato,
faço corpo mole, perco o jogo
e não aprendo a lição.
Tanta coisa é mais importante
que o seu beijo ou o meu espelho,
mas eu só vejo na escuridão.

quinta-feira, 31 de março de 2011

A natureza do escorpião

O mestre da merda
no ventilador.
O avesso do Midas,
o arquiteto do fracasso,
o rei das bolas fora.
O maior autosabotador
do planeta,
espalhafato espantalho
que convida corvos e
não protege o milharal.
Senhor desse deserto devastado,
dano colateral,
eu juro que não queria,
mas não pude evitar.
A natureza do escorpião.
Morreremos.
Peço desculpas
como se houvesse reparo,
segunda chance, outra vida.

sábado, 19 de março de 2011

Ao seu redor

Neste instante exato
em que dorme nua,
poderosa e delicada,
revela-se o fato:
tudo ao redor é lua,
elegia a você dedicada.
Dançam estrelas balé moderno
com teu solo ao centro,
sol que não vai se pôr.
Neste instante eterno
que brilha raro dentro
você é meu melhor amor.

domingo, 6 de março de 2011

Já que você

Já que você me ignora
eu vou embora
procurar ser feliz
tentar achar quem me diz
eu te amo
esta noite
fugir ao açoite
da tua distância
caçar com ânsia
eu te amo
numa boca mentirosa
verdade gostosa
alguém pra me dizer
alguém pra te esquecer
eu te amo.

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Trilha sonora do inferno

O pernilongo ao redor do ouvido
o tiro na escuridão
o chocalho da cascavel
o chocalho do músico
(o funk, o samba, o axé, a música que você não quer)
o apito incessante do guarda
a unha na lousa
o choro estridente da criança chata
o pranto da mãe pelo filho perdido
o gemido da mulher nos braços do outro
a britadeira rompendo o asfalto
o sopro na caneta vazia
o rato no sótão
os passos na escada de metal
o abre e fecha dos arquivos de aço
o amolador de facas
o sinal dos pratos prontos na praça de alimentação
o aviso de mensagem do Blackberry
o canto do pneu freando sem evitar a batida
a pancada, o som do não
sua voz dizendo que eu estraguei tudo.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Longe

Meu livro retirado da estante
pesa como tijolo.
Não presta para erguer paredes,
atire-o contra a vidraça.
Caminhe sobre os cacos
e conhecerá meus passos.
Há sol, mas quero chuva de granizo
para lavar meu corpo.
É tão longe pra onde vou.
O que sou o tempo apaga –
até mesmo a lixa áspera
um dia afaga.
Eu serei outro. Eu serei algodão.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Os mesmos olhos

o que sou não
tenho sido.
este que estou sendo
é o que não está
no reflexo do espelho.
este que não está se vendo
permaneceria
invisível ainda que tingisse
o corpo de vermelho vivo.




sobre meus olhos ela diz
que são os mesmos há vinte anos
e eles nada dizem.
ocultam.
são tão somente águas
turvas de raso escuro rio.
quebrei o espelho da alma.
sou bom nisso:
dissimular.
sou
solidão e superfície.

domingo, 30 de janeiro de 2011

As noites em que oculto

Espreito
feito gato preto
na noite.
Espio
fresta de luz
que me fere e alivia.
Astuto,
sob sua janela
me oculto.
Ilumina
minha vida,
eu te pediria.
Vestuto,
permaneço quieto
e me despeço.
Faço de conta
que te beijo
e apresso o passo.
Soturno
em vigília,
viro turnos.
Espero
você fazer
meu dia.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Love story

Fria e sinceramente, ele a preveniu de que partiria o seu coração.

Foi naquele preciso momento que ela se apaixonou.

Não resistiu a um homem tão honesto.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Veritas

Antes do primeiro beijo,
bebemos vinho.
Nunca mais bebi sozinho.
O mesmo desejo
se faz sempre vizinho.
Não o teu corpo.
Não o teu corpo.